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AS REPRESENTAÇÕES MIDIÁTICAS-CULTURAIS DA HOMOSSEXUALIDADE E ADOLESCÊNCIA NA NETFLIX: UMA ANÁLISE

DE YOUNG ROYALS

Maicon Douglas Holanda[1]


RESUMO:

Este artigo examina a série Young Royals, sob a ótica dos estudos de mídia e cultura na contemporaneidade. Nesse ínterim, objetivamos trazer à baila uma discussão sobre os horizontes de análise das correlações sociais, como as questões de intersecção entre raça, classe, gênero e desigualdade social. Adiante, visamos também problematizar as representações e simbologias dos personagens diante do ideal da adolescência, ainda mais quando se trata do contexto da cinematografia europeia, em que predomina o monopólio de produções baseadas na legitimação dos padrões corporais, da composição conservadora de família, da cultura fílmica essencialmente pautada no sujeito branco. Ao final, o ensaio faz jus a importância e contribuições dessa produção para a desestigmatização dos simbolismos e para a relevância da consciência sobre a ocupação de espaços sociais por sujeitos subalternizados e invisibilizados diante da produção cinematográfica hegemônica no tempo presente.


A Indústria Cultural, o enredo e os aparentes propósitos discursivos de Young Royals


A Indústria Cultural, ao longo do tempo, vem se tornando cada vez mais presente na vida dos sujeitos. Isso decorre da formação de uma sociedade, como a brasileira, em que espaços de produção de conhecimentos e de entretenimento são cocriados na sociedade de mídia, globalizada e capitalista. Com isso, por vezes nos deparamos com múltiplos conteúdos que retratam a vida entremeada nessas questões. A sociedade em rede, conceito atribuído por Manuel Castells, se torna cada vez mais comum perante a composição da cotidianidade pautada nas redes sociais, na interatividade cibernética e da assistência de conteúdos programáticos e de entretenimento surgidas com as diversas plataformas de streaming, como a Netflix[2], uma vez que essa é considerada a maior plataforma de armazenamentos de filmes, séries e documentários produzidos nos últimos tempos.

Indústria Cultural é um conceito atribuído por Theodor Adorno e Max Horkheimer em 1947 dispostos inicialmente no livro A dialética do esclarecimento. Sobre esse conceito, o cientista social brasileiro Jean Henrique Costa afirma que “a Indústria Cultural é fruto da oportunidade de expansão da lógica do capitalismo sobre a cultura. Não somente esse avanço progressivamente acontece no domínio do cultural, mas também, cada vez mais, nas esferas da biologia (corpo), da natureza, das relações humanas, do conhecimento etc” (COSTA, 2013, p. 136).

Apesar de A dialética do esclarecimento ser uma obra datada, há algumas limitações do conceito de Indústria Cultural. Mesmo assim, o que se deve levar em consideração, ainda nos dias atuais, é a predominância dos fenômenos culturais e o método crítico presente na cultura de mídia, outro conceito postulado por Douglas Kellner no passado para reforçar a produção das representações culturais e simbólicas nas práticas da sociedade inteiramente midiatizada. Costa afirma que:


[...] a heteronomia cultural; a transformação da arte em mercadoria; a hierarquização das qualidades; a incorporação de novos suportes de comunicação pelos setores que já detinham os meios de reprodução simbólica; o caráter de montagem dos produtos; a capacidade destes em prescrever a reação dos receptores; a reprodução técnica comprometendo a autenticidade da arte; o consumidor passivo; a falsa identidade entre o universal e o particular; a técnica como ideologia; o “novo” como manifesto do imediato; e a fraqueza do “eu” apontam para a continuidade da administração da cultura. Dessa forma, o conceito não é apenas atual, como empiricamente demonstrável (COSTA, 2013, p. 136-137).

E é sobre essa indústria que visa o lucro ー pois insere-se em uma plataforma de streaming ー e sua imersão na sociedade midiatizada, que a série Young Royals pode ser considerada um produto cultural, que apesar dos preceitos de inserção nesse “pacote cultural”, se consolida como uma produção que se diferencia de demais produções. Primeiro porque evoca uma integração de personagens em sua diversidade, como o protagonismo de dois sujeitos homossexuais, tendo em vista que esse grupo social considerado “minoria” sempre foi silenciado, marginalizado, criminalizado, seja na sociedade real, seja nas sociedades representadas através de obras fílmicas, ficcionais. Segundo porque essa obra tem o desejo de estabelecer uma discussão sobre os padrões do corpo diante da adolescência.

Nesse sentido, estes escritos tem como mote trazer algumas reflexões sobre as representações da adolescência e da homossexualidade na série Young Royals, disponível na plataforma de streaming Netflix. Emoldurada por seis episódios, a primeira temporada dessa série tornou-se disponível ao público no dia 1º de julho de 2021. O produto midiático-cultural sueco conta com a direção de Rojda Sekersöz e Erika Calmeyer e é escrita por Lisa Ambjörn, Sofie Forsman e Tove Forsman.


Imagem 01:Trailer da primeira temporada de Young Royals

Fonte: Netflix (2021).


Num aspecto mais geral, o enredo aborda a história do príncipe Wilhelm (Edvin Ryding), herdeiro ao trono da Suécia, e de Simon (Omar Rudberg). A história de amor surge quando ambos se esbarram no renomado internato Hillerska, uma referência de ensino para a elite sueca. A série performatiza um roteiro que enfatiza os descobrimentos, os medos e os dilemas comumente designados pela grande mídia sobre a adolescência, dando a entender que as identidades encontram-se fragmentadas (HALL, 2014) no discorrer de uma sociedade cada vez mais globalizada e culturalmente híbrida.


[...] a “globalização” se refere àqueles processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado. A globalização implica um movimento de distanciamento da ideia sociológica clássica da “sociedade” como um sistema bem delimitado e sua substituição por uma perspectiva que se concentra na forma como a vida social está ordenada ao longo do tempo e do espaço (HALL, 2014, p. 67-68).

A história de Wilhelm e Simon é mediada pela lógica biológica como uma ordem natural que condiciona as relações humanas e as identidades no mundo pós-moderno. Esse determinismo, porém, inviabiliza discursos sobre os prazeres dos corpos num tom de biopoder, isto é, o que se deve fazer como correto ou verdadeiro (FOUCAULT, 1988). Sobre a questão da formação das identidades na pós-modernidade, Hall pontua que elas são construídas historicamente e não através dos preceitos biológicos. Esse antropólogo afirma que o sujeito:


[...] assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas [...]. A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente (HALL, 2014, p. 13).

E é nesse contexto que os protagonistas de Young Royals traçam um percurso sobre suas descobertas sexuais homoafetivas, que muitas vezes é negligenciada e colocada como "último plano”, pois a descoberta da condição da comunidade LGBT+ nos personagens é vista como algo momentâneo, confuso. Isso se deve ao fato de que o imaginário social reforça o simbolismo de que a adolescência é um momento de descobertas, mas de confusão das “escolhas”, na reafirmação de inúmeras práticas culturais e condições de vida, e dentre eles, a sexualidade acaba se enquadrando nestes paradigmas sociais.


Em boa parte, os homossexuais obtêm sentimentos de vergonha e culpa. Dessa forma eles evitam exposição pública, desenvolvendo sentimento de inadequação que podem contribuir para o desenvolvimento enfraquecido de habilidades sociais, reafirmando novamente a importância de uma base familiar que os acolha. Pais intolerantes, extremamente religiosos ou que empregam grandes sonhos nos seus filhos em perpetuar o que lhe foi ensinado tendem a aceitar com maior dificuldade a sexualidade deste adolescente, e mesmo atualmente havendo maior tendência de aceitação, ainda é um tabu falar sobre a sexualidade num modo geral (GUIMARÃES, 2015, p. 8).


Para Contardo Calligaris, “A adolescência se torna assim um ideal dos adultos. Ou seja, os adultos não se contentam mais com o consolo oferecido pela visão das criancinhas felizes. Eles encontram nos adolescentes idealizados um prazer menos utópico e mais narcisista. Os adolescentes oferecem uma imagem plausível, praticável” (CALLIGARIS, 2000, s/p). A adolescência é o “salto em direção a si mesmo, como ser individual e único. Havendo, portanto, um movimento de crescimento, tanto intelectual e nas suas relações, como físicas” (GUIMARÃES, 2015, p. 4).


Nesse sentido, os argumentos de Calligaris e Guimarães sugerem que, ao mesmo tempo em que a imagem do adolescente é tida como o ideal de vida incorporada pelos adultos, para além disso, é na fase da adolescência também que as trajetórias que esses sujeitos (res)significam suas identidades, se descobrem e resistem ao atravessamento de opressões da sociedade moralista, desigual e, em considerável parte, conservadora. E é sobre esses meandros que a narrativa audiovisual problematiza essas questões sociais e culturais no tempo presente.


A primeira análise midiática-cultural: as intersecções entre raça, classe e gênero


Logo no início dos episódios, uma das primeiras constatações acerca das características de composição dos personagens e do enredo é a evidente discussão interseccional entre raça, classe e gênero. A primeira interpretação cultural da série se justifica pelo fato de que os personagens principais, Wilhelm e Simon, são gays.

Primeiramente, Simon “representa todas as formas de exclusão num único personagem: ele é gay, morador da periferia, de origem venezuelana, de pele mais escura que os colegas, filho de mãe imigrante, de pai dependente de drogas e irmão de uma menina com Síndrome de Asperger” (CARMELO, 2021, online). Já o príncipe herdeiro Wilhelm


[...] vive em palácios e festas, cercados por amigos interessados na proximidade com a realeza, e por meninas buscando conquistar o coração do herdeiro. Embora a estrutura tente diversificar esta premissa através dos coadjuvantes (a estudante mais rica da escola é uma garota negra; o primo de Wilhelm está secretamente falido), a série se baseia na clássica paixão proibida entre ricos e pobres; o príncipe e o plebeu; o branco e o latino (CARMELO, 2021, online).

Sobre o cruzamento da história dos personagens gays e sobre a manutenção do status quo calcada na questão classista, o teórico cinematográfico Bruno Carmelo afirma que:


Existe, em primeiro lugar, a opressiva relação de classes: dentro de uma das escolas privadas mais elitizadas da Suécia, abre-se a cota para os moradores pobres da região frequentarem as mesmas aulas que os filhos de bilionários. Os criadores [...] utilizam este ponto de partida para aproximar a família pobre de Simon daquela riquíssima de Wilhelm (CARMELO, 2021, online).

A tríade interseccional (gênero, raça e classe) de que tratam a Identidade e Diferença rompem demasiadamente com alguns paradigmas da existência de uma normatização da cinematográfica ao longo do tempo, sobretudo nas produções hollywoodianas e europeias, pois é comum percebermos que essas produções carregam o domínio de protagonistas nas condições de héteros e brancos, e quando há gays, estes comumente não são protagonistas do enredo.


Imagem 02: Wilhelm (Edvin Ryding) e Simon (Omar Rudberg) no 4º episódio

Fonte: Netflix (2021).


Quando a série acentua o protagonismo de um casal homossexual, sendo ainda um deles negro e pobre, a Indústria Cultural mobilizada pela série elucida ao públicoou às massasa importância do debate sobre as pautas identitárias de gênero, sexualidade, raça e classes, mesmo que isso decorra de uma rechaça ou polarização perante a opinião pública (HALL, 2014).


[...] quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade [...] Questionar a identidade e a diferença significa, nesse contexto, questionar os sistemas de representação que lhe dão suporte e sustentação. No centro da crítica da identidade e da diferença está uma crítica das suas formas de representação (SILVA, 2014, p. 91).

Essas representações propostas por Young Royals podem contribuir para o rompimento das grandes estruturas sociais e de poder. Mesmo assim, “[...] as identidades nacionais não subordinam todas as outras formas de diferença e não estão livres do jogo de poder, de divisões e contradições internas, de lealdade e de diferenças sobrepostas” (HALL, 2014, p. 65). As relações sociais no filme se estabelecem mediante as relações de poder, da diferença entre adultos e adolescentes, professores e estudantes, ricos e pobres, negros e brancos, etc.


A segunda análise midiática-cultural: a homossexualidade e o determinismo biológico


O segundo aspecto cultural mobilizado é a questão da descoberta da homossexualidade vivenciada por um príncipe herdeiro ao trono sueco. Obviamente essa função social está ligeiramente associada à uma composição familiar extremamente hierárquica e heteronormativa, baseada nos preceitos do determinismo biológico. Há, portanto, a preocupação com a descendência. Em outras palavras, há a necessidade da permanência de herdeiros para a sucessão do trono real. No enredo, ocorre uma fatalidade que modifica as descobertas da adolescência e a relação homoafetiva entre Wilhelm e Simon: a morte do príncipe herdeiro da Suécia, Erik (Ivar Forsling), que é irmão mais velho de Wilhelm, que agora terá que cumprir suas obrigações reais e viver a vida cercada pela moralidade e pela privação da liberdade de expressão e de sua própria sexualidade, tendo em vista a rechaça das sexualidades divergentes da matriz heterossexual e da presente imposição/disseminação de uma única identidade ou outros valores e normas de comportamento na sociedade (HALL, 2014). Quando a opressão da sexualidade de Wilhelm e Simon ocorre no enredo, podemos associá-la à prática de homofobia, que se efetiva nas diversas instituições sociais, seja na escola ou na própria família (sobretudo na do príncipe herdeiro Wilhelm). Sobre esse conceito bastante discutido na contemporaneidade, Guimarães explica:


A homofobia é exercida por meio do incentivo ao castigo, à hostilidade, ao preconceito e à reprodução de forma caricatural dos comportamentos homossexuais nos meios de comunicação. A família e a escola ampliam ideias negativas quanto à homossexualidade na medida em que adolescentes “aprendem” a desmerecer e diminuir o homossexual, dessa forma elas reproduzem atitudes homofóbicas aprendidas e replicadas por gerações, afetando diretamente estes indivíduos (GUIMARÃES, 2015, p. 7).

A identidade é, portanto, aquilo que define o que um sujeito é, ao passo que a diferença é aquilo que não é (SILVA, 2014). Nesse caso, Wilhelm, por se “descobrir” e possuir uma identidade gay, o personagem automaticamente promove a diferença por não ser heterossexual. Essas distinções ocorrem nas relações sociais, pois é necessário atribuir significados para que possamos conceber as identidades e as diferenças, levando em consideração que essas noções não são inatas (HALL, 2014). E é justamente através da noção de que a sexualidade deve se pautar através das questões biológicas que muitos adolescentes homossexuais “expressam o sofrimento ainda na infância, ao se perceber diferente da maioria, se culpam, escondem-se e sofrem sozinhos” (GUIMARÃES, 2015, p. 8).


A terceira análise midiática-cultural: adolescência e os padrões corporais


Em última análise, é importante problematizar a questão do padrão corporal estabelecido pela grande mídia, bem como os padrões de beleza impostos pela sociedade imediatista e espetacularizada em conformidade com as redes sociais. Essas características são perceptíveis nos personagens Wilhelm, August (Malte Gårdinger) e Felice (Nikita Uggla), por exemplo, que possuem seus rostos cobertos de espinhas. Felice, além de possuir espinhas, ela está com seu peso acima do ideal, isto é, se considerarmos o padrão estético e imagético promovido pelas publicidades, filmes e demais produções audiovisuais.


Imagem 03: Felice (Nikita Uggla) evidenciando rosto com espinhas no 2º episódio

Fonte: Netflix (2021).


Sob esse viés, é possível inferir que é consensual a percepção de que as produções cinematográficas preferem não protagonizar esses “desfalques corpóreos" que naturalmente são traços biológicos comuns nessa fase da vida. Contudo, a indústria estética e a padronização dos corpos intencionalmente “encobrem” essas "imperfeições'', por não serem bem aceitas à sociedade em rede (CASTELLS, 1999). Sobre a questão do ideal de adolescência na contemporaneidade, Calligaris afirma que os adolescentes


[...] se reúnem em grupos que podem ser mais ou menos fechados, mas sempre apresentam ao mundo uma identidade própria, diferente do universo dos adultos e dos outros grupos. No mínimo, são comunidades de estilo regradas por traços de identidade claros e definidos, pois os membros devem poder pertencer a elas sem ter de coçar a cabeça se perguntando: "Mas o que será que os outros querem para me aceitar?" Os grupos têm portanto em comum um look (vestimentas, cabelos, maquiagem), preferências culturais (tipo de música, imprensa) e comportamentos (bares, clubes, restaurantes etc.). o resultado disso é que cada grupo impõe facilmente a seus membros uma conformidade de consumo bastante definida. Por isso mesmo, todos os grupos se tornam também grupos de consumo facilmente comercializáveis. Os adolescentes, organizados em identidades que eles querem poder reconhecer sem hesitação, se tornam consumidores ideais por serem um público-alvo perfeitamente definido. A adolescência e suas variantes são assim um negócio excelente. O próprio marketing se encarrega de definir e cristalizar os grupos adolescentes, o máximo possível. Os grupos, nascidos como amparo contra a moratória imposta pelos adultos, se constituem em ideais para os adultos justamente por serem rebeldes. Ao mesmo tempo, esses grupos são culturalmente exaltados pelo marketing, que tem todo interesse em apresentá-las como coesos, catalogando os apetrechos necessários para seus membros, comercializando as senhas de reconhecimento e todos os traços do look suscetíveis de circular no mercado (CALLIGARIS, 2000, s/p).

No caso da série, ela se distancia de demais produções cinematográficas que hegemonicamente priorizam-se os corpos malhados, magros e com rostos rigorosamente maquiados, sem espinhas, tidos, por conseguinte, como ideais de adolescência perante a lógica do mercado e pela cultura de mídia (KELLNER, 2001).


Imagem 05: Repercussão sobre vídeo íntimo de Wilhelm e Simon nas redes sociais, no 5º episódio


Fonte: Netflix (2021).


Se por um lado, no passado recente, as produções estivessem atentas somente ao ideal de adolescência e de identidade capazes de gerar uma legião de fãs em todo mundo, gerando lucros sem uma real crítica social. Por outro, a série Young Royals pode ser encarada como uma produção europeia que rompe com alguns paradigmas padronizadores impostos culturalmente como normativos. A produção, desse modo, apresenta outros ideais de adolescência e de identidades ancoradas na necessidade de debates sobre identidade e equidade dirigidas à cultura massiva.


Considerações finais


Este artigo propõe realizar uma breve análise midiática-cultural dos capítulos da primeira temporada de Young Royals, na plataforma de streaming Netflix. A discussão, baseada nos conceitos de Indústria Cultural, adolescência, identidades, interseccionalidade, problematiza a formação de um produto cultural (a série) na composição da Indústria Cultural (a Netflix), que potencialmente visa o lucro diante dos streamings evocados por essa cinematografia. Mesmo assim, a produção, mesmo fazendo parte da lógica capitalista do consumo, não deixa de tecer representações concretas sobre os temas considerados “sensíveis” por grande parcela da população mundial, como a homossexualidade.

Ao tratar da homossexualidade, os idealizadores da trama inculcam os personagens num dilema ainda mais crítico: a história de amor entre dois adolescentes, um negro e periférico; e o outro, herdeiro ao trono da suécia, branco e rico. Essa dicotomia potencializa o princípio do “amor ainda mais impossível” entre os protagonistas. Nesse intuito, as relações entre raça, classe e gênero se fazem presente, e é bastante perceptível desde o primeiro episódio.

Por conseguinte, além da história de amor, que é inconclusatendo em vista que foi confirmada a continuidade da trama em uma segunda temporada ー, o enredo traz a tona discussões sobre o ideal de adolescência na contemporaneidade, bem como tece uma discussão sobre os paradigmas corporais e de imagem dos atores diante das produções cinematográficas, pois há a representação de personagens com espinhas no rosto, negros e relativamente “obesos”. Convém mencionar que, para uma produção europeia, essa produção foge da hegemonia das produções cinematográficas que se prezam em selecionar personagens brancos, com poder aquisitivo mais elevado e com o protagonismo simbólico de uma sociedade heteronormativa.


Referências

CALLIGARIS, Contardo. A adolescência como ideal cultural. In: ________. A Adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.


CARMELO, Bruno. Young Royals T01. Papo de Cinema, 2021. Disponível em: <https://www.papodecinema.com.br/series/young-royals/young-royals-t01/>. Acesso em: 12 jan. 2022.


CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1991.


COSTA, Jean Henrique. A atualidade da discussão sobre a indústria cultural em Theodor W. Adorno. SciELO. Trans/Form/Ação, Marília, v. 36, n. 2, p. 135-154, Maio/Ago., 2013.


FOUCAULT, Michel. História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.


GUIMARÃES, Luigi Sturaro. Homossexualidade na adolescência na contemporaneidade. Psicologia.pt. p. 1-15, 2015.


HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Editora Lamparina, 2014.


KELLNER, Douglas. A cultura da mídia: identidade e política entre o moderno e o pós-moderno, Bauru, SP: EDUSC, 2001

SILVA, Tomaz Tadeu da. Identidade e Diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais/ Tomaz Tadeu da Silva (Org.) Stuart Hall, Kathryn Woodward. 15ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

[1] Mestrando em Estudos de Cultura e Território pela Universidade Federal do Norte do Tocantins (PPGCULT-UFNT/Araguaína). É graduando em Jornalismo pela Universidade Federal do Tocantins (UFT/Palmas). É graduado em História pelo Centro de Ciências Integradas da Universidade Federal do Tocantins (UFT/Araguaína). E-mail: maicondouglasholanda@gmail.com.

[2] Foi fundada em 29 de agosto de 1997 por Reed Hastings e Marc Randolph, com sede em Los Gatos, Califórnia, nos EUA. A empresa surgiu como um serviço de entrega de DVD pelo correio, e nos dias atuais, essa plataforma global de filmes e séries de televisão via streaming possui mais de 220 milhões de assinantes em todo o planeta.

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