Ayrton Matheus da Silva Nascimento
Licenciado em História pela UFAL, Campus do Sertão. Atualmente é aluno vinculado ao PROHIS/UFS. E-mail: ayrtonmatheus2015@hotmail.com.
Resumo:
O presente artigo tem como objetivo investigar os sentido produzidos hoje a cerca do movimento estudantil (ME) brasileiro. Deste modo, nos debruçamos sobre dois recortes de sites de livre acesso ao público, enquanto ferramentas de buscas e pesquisas para os leitores que desejam se “informar” acerca de diversos temas, inclusive o ME, a saber: o site Vai de bolsa (de iniciativa privada) e o site da UNE (fruto da mobilização organizativa estudantil). Assim sendo, buscamos perceber quais os sentidos são produzidos em torno do ME veiculados a partir desses materiais. Nesse sentido, lançamos mão de uma abordagem qualitativa (CHIZZOTTI, 2003; CHUEKE, 2012; LIMA, 2018), sob o dispositivo metodológico da Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011; 2016) e o suporte do referencial de literatura na compreensão do objeto investigado. Nos permitindo perceber distintas formas de caracterizar o movimento, entre aspectos inerentes (público constitutivo, mobilização e articulação dos estudantes) e moventes (pautas e ações de acordo com as conjunturas políticas e condições históricas as quais o movimento se inscreve), nos apresentado, antes de tudo, não enquanto um movimento uníssono, mas plural em sua constituição, essencialmente marcado pelo seu caráter e interesse pelos direitos sociais coletivos e defesa da democracia, por meios da mobilização, articulação dos estudantes frente de resistência ante inúmeras conjunturas políticas.
Palavras-chave: Movimento Estudantil; Sentidos; Tempo Presente.
Introdução
O movimento estudantil brasileiro consolidou-se a partir de inúmeras articulação, pautas, mobilizações, embates e conquistas ao longo da história, em distintas conjunturas políticas, desempenhando papel importante, organizativo, em um período que se compreende entre os anos de 1901 com a sua emergência, estendendo-se, a sua importante atuação, até o tempo presente.
É importante destacar que a leitura que estabelecemos do movimento estudantil brasileiro, ao longo da história, configura-se, antes de tudo, enquanto um movimento formado por distintas formas organizativas, em múltiplos recortes e atuações espaciais, além de possuírem uma pluralidade inerente ao movimento, nas suas múltiplas formas de manifestação, articulação, expressão, atuação, pautas, etc., e em suas relações com outros movimentos e setores da sociedade (POERNER, 1979; MENDES JÚNIOR, 1982; MESQUITA 2013; BOUTIN e FLACH, 2017 ).
Sua notoriedade, enquanto movimento social, deve-se a sua forte e importante atuação em momentos ímpares na historiografia brasileira, por meio das articulações estudantis, com a promoção de fóruns, debates, assembleias, organizações, manifestos, etc., que contemplavam os temas latentes a educação brasileira e ao modelo universitário público ofertado (MESQUITA, 2013).
Dessa maneira, o Movimento Estudantil (doravante ME), ao primar as suas críticas em relação a estrutura social e política do nosso país, claramente explicitou o seu posicionamento de que a educação pública e gratuita seria o ponto chave para reivindicação e transformação das relações sociais, sendo uma atividade também de base e importante na transformação das relações sociais. Além da demonstração da crítica social, a ênfase nas ações coletivas e organizadas caracterizou de modo singular os contornos do movimento no nosso país, além da forte aproximação com os interesses e das pautas que tangem a classe trabalhadora.
Em particular, destacam-se as suas relações com o Estado, desempenhando um importante papel durante o período da ditatura civil militar, ganhando notoriedade em seus contornos a partir de 1968 (importante marco para os movimentos estudantis, no Brasil, e em outros países), e passando a despertar o interesse de inúmeros cientistas nas décadas subsequentes de 70 e 80 (MESQUITA, 2003).
Dessa maneira, a pergunta inicial que buscamos mobilizar, e que ocupará as linhas deste trabalho, enquanto essencialmente incontornável na compreensão e história do movimento, se definiu nos seguintes termos: como o movimento tem sido definido pelos próprios movimentos e/ou sites que buscam informar aos leitores interessados em torno da temática? Nos apontando, deste modo, as percepções que este movimento tem produzido de si, e como segmentos outros têm percebido e atribuindo sentidos a este em particular.
Assim sendo, buscaremos analisar os sentidos produzidos em torno da definição de movimento estudantil, entre a movência e a estabilidade dos sentidos, nos permitindo compreender como a história se inscreve no seio desse(s) movimento(s), e como este movimento encontra-se inscrevendo-se e materializando-se na história enquanto experiência política e histórica desses sujeitos.
Do ponto de vista teórico, o movimento estudantil, tomado enquanto objeto de estudo, por distintos sujeitos e campos do conhecimento, na tentativa de compreendê-lo e aprendê-lo, busca(ra)m delimitá-lo e defini-lo a partir dos múltiplos aspectos que os constituem, sendo nosso interesse em particular interrogar as delimitações e definições do movimento.
Chamaremos de sentido estabilizado, este que objetiva nos fornecer uma definição conceitual acerca do movimento, no intuito de torná-lo inteligível para ao interlocutor que se aventura na busca de compreendê-lo.
Dessa maneira, buscamos contribuir para a desnaturalização em torno da definição e dos sentidos que circulam em torno do movimento estudantil, de modo a perceber os aspectos designativos e distintivos na constituição e compreensão do movimento, a partir de distintos sites, e materiais que buscam nos dar a saber e a conhecer acerca da historicidade e dos aspectos/marcos significativos em torno do movimento. E agregar aos trabalhos que tem o seu interesse voltado a semântica histórica que constitui e adensa a história do movimento social estudantil.
No intuito de alcançarmos os objetivos propostos, lançamos mão de uma abordagem qualitativa (CHIZZOTTI, 2003; CHUEKE, 2012; LIMA, 2018), sob o dispositivo metodológico da Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011; 2016). De igual modo, nos inscrevemos dentro de um exercício de História do Tempo Presente (DOSSE, 2012), sobre questões ainda em construção diante dos nossos olhos, com inúmeros reflexos e redesenhos, entretanto, importantes na compreensão da experiência histórica, hoje, dos homens no tempo e no espaço (BLOCH, 2001). Além de nos situarmos dentro de uma História Social dos Movimentos Sociais em particular do movimento estudantil brasileiro.
As fontes que buscamos empregar na constituição deste trabalho, consistem em fontes secundárias, selecionadas a partir de dois sites de livre acesso, disponíveis em buscas nas plataformas digitais como Google, a saber: Vai de bolsa e UNE, produzidos com o objetivo de apresentar, caracterizar, historicizar e informar para o público leigo e especializado, gestos de leitura e interpretação políticas sobre o Movimento Estudantil. Assim sendo, recortamos, para a constituição da nossa corpórea dois recortes, dos quais voltavam-se especificamente para definir em que consiste o movimento estudantil brasileiro.
Dessa maneira, passamos a estruturar o nosso trabalho do seguinte modo: em um primeiro momento versar sinteticamente sobre os contributos da revisão de literatura em torno da compreensão do movimento estudantil enquanto um movimento social. Seguido da apresentação do nosso corpus analítico e do nosso percurso de análise, encaminhando o nosso leitor, deste modo, para as nossas considerações finais. Percebendo a construção dos sentidos de movimento estudantil é fortemente interligada a historicidade que constitui o movimento entre aspectos estabilizados e moventes na construção política do movimento ao longo da história nesse constante deslize e mudança da/na história.
O movimento e a articulação estudantil brasileiro na história: alguns apontamentos
O movimento estudantil brasileiro possui em sua caracterização uma relação direta com os aspectos sociais, no intuito de promover e garantir efetivação da democratização, além da garantia de uma educação pública, de qualidade e acessível. Esse interesse pelo social em particular, nos relatam Boutin e Flach (2017), foram responsáveis por nortearem o movimento da sua gênese até o presente. Dessa maneira, para este autores, na própria historicidade que compõe o movimento, da mobilização da juventude, tendo por fundamento o diagnóstico da realidade social, é impresso em sua bandeira de reivindicações enquanto uma das principais características do movimento (BOUTIN e FLACH, 2017).
As primeiras movimentações de jovens estudantes na historiografia brasileira, tem reflexos primórdios desde movimentos de 1710 com o engajamento de jovens brasileiros na promoção e expulsão do corsário francês no Rio de Janeiro (POERNER, 1979), em 1786 com o objetivo da promoção da independência do Brasil do regime político portugues (MENDES JÚNIOR, 1982). Tendo, posteriormente, as primeiras organizações coletivas com as sociedades acadêmicas e civis acadêmicos, ainda no período colonial com teses que primavam pela implantação de um regime republicano, e a abolição da escravatura (MENDES JÚNIOR, 1982).
A década de 1930, também possuiu destaques importantes para a consolidação do ME brasilero. Com a sua importante atuação à frente da revolução constitucionalista, sendo uma das principais vozes na manifestação na frente anti-Getúlio, e a vindicação para promoção da Assembleia Constituinte. Como vemos:
Na década de 1930, os estudantes voltaram a explicitar seu posicionamento político frente à sociedade. Em 1932, no contexto da Revolução Constitucionalista, a participação estudantil “representou a primeira prova de fogo a que foi submetido o poder de Getúlio Vargas nos seus quinze anos de governo” (MENDES Jr., 1982, p.28). Naquele ano os estudantes, engajados na Frente Única anti-getulista, participaram de manifestações em apoio de uma campanha pelas eleições para uma Assembleia Constituinte. (BOUTIN e FLACH, 2017, p.218)
Em 1938, com a mobilização estudantil promovida pela UNE, é tomada como um importante marco para articulação do ME tendo em vista a sua mobilização e organização a nível nacional. Desse modo, a UNE assume importante papel na frente e mobilização do movimento, conseguindo articular estudantes do Norte a Sul do país. Nas palavras de Boutin e Flach (2017):
A partir da UNE, o movimento estudantil brasileiro não apenas ganhou projeção nacional, mas também unificou os estudantes de norte a sul em torno dos mesmos objetivos. Com a UNE, os estudantes realizaram a crítica social e imprimiram uma marca ao movimento: a luta pela educação e pela ampliação de direitos para toda a coletividade. (BOUTIN e FLACH, 2017, p.219).
No tocante à democratização do ensino, destacou-se em 1959, ocasião em que a mobilização estudantil buscou combater o “[...] Projeto Lei que, posteriormente, instituiu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Por meio do jornal ‘O metropolitano’, os estudantes teceram críticas ao referido projeto lei para a educação.” (BOUTIN e FLACH, 2017, p.219).
Outro marco significativo para a história do ME brassieliro foi a sua atuação no período da ditadura civil militar (964-1985). Nesse contexto:
A UNE, enquanto instituição que historicamente se posicionou em favor da ampliação de direitos sociais, foi uma das primeiras instituições a sofrer com a ação do militarismo, sendo alvo de inúmeras perseguições, as quais culminaram com mortes e tortura de seus líderes. Os militares foram incansáveis em encontrar estratégias que objetivavam a liquidação do movimento estudantil. (BOUTIN e FLACH, 2017, p.222).
Essa perseguição, claramente se caracterizava pela vinculação do movimento a forte defesa da democracia, e a ligação do momento vinculado a partidos de esquerda, além do seu poder de articulação e mobilização sendo encarada enquanto uma forte ameaça ao regime totalitário.
Dessa maneira, o ME, se constituiu ao longo da história, a partir da sua forte capacidade de mobilização e engajamento, em vindicação de direitos sociais. Além de combater as desigualdades sociais e econômicas que marcaram a história do nosso país.
Essa história de militância atrelada ao movimento, ainda reflete preponderante na contemporaneidade, a exemplo das “[...]ocupações de espaços escolares [...] exemplos recentes que explicitam como o movimento estudantil brasileiro pode exercer sua força organizativa e contribuir para a formação de uma consciência coletiva que tenha a transformação social como fim.” (BOUTIN e FLACH, 2017, p.228). Nos fornecendo, deste modo, novos contornos ainda hoje acrescentados a historicidade do movimento, sempre objetivando aspectos sociais, articulando suas pautas e ações a depender da conjuntura política que tem se desenhado no cenário brasileiro deixando de modo significativo as suas marcas.
Da constituição do corpus
A constituição do nosso corpus analítico, deu-se a partir da seleção de dois recortes, em sites, escolhidos a partir de um exercício de busca simples no Google sob a palavra de busca “movimento estudantil”. Deste modo, escolhemos os dois primeiros sites indicados. Os critérios empregados na seleção consistia em recortes que buscassem definir o ME. A questão do algoritmos na sugestão dos conteúdos apresentados, pela proposta que objetivamos não comprometeria em hipótese alguma a efetivação deste trabalho, tendo em vista que nos interessa, apreender os sentidos que operam, funcionam e circulam socialmente, ao público em geral, em torno de movimento estudantil. Além de se efetivar em um empreendimento qualitativo, podendo posteriormente ser expandido em trabalhos e análises posteriores.
Dessa maneira, nos conduzimos ao material apresentado, na leitura e compreensão do material na íntegra, recortando os pontos fulcrais que se debruçaram especificamente na caracterização e definição do ME. Materializado nos dois recortes que analisaremos. Os sites selecionados foram: Vai de bolsa e Une. Na descrição da proposta dos sites, como o leitor perceberá, não buscamos problematizar as vinculações político-partidárias que os sites sustentam, antes, pela proposta deste trabalho, deteremos o nosso olhar, ao que eles dizem, e como eles definem o ME, nos permitindo apreender o funcionamento dessas vinculação materializados na prática, enquanto gestos de leituras e conceituações do ME, no material analisado.
A página Vai de Bolsa, trata-se de uma iniciativa privada, que objetiva em última instância o incentivo a alunos a ingressarem a aproveitarem oportunidades de bolsas de estudo em faculdades privadas. Se configurando enquanto uma plataforma de consulta e de busca livre de conteúdo para estudantes, principalmente do Ensino Médio, com artigos voltados a temas que caem nos vestibulares, e, deste modo, prima alcançar, por meio das matérias o seu público alvo, com o intuito de oferecerem as possibilidades de bolsa com o fim privativo.
E, por fim, o site da UNE, gerido pela mesma organização, no intuito de informar, enquanto principal entidade de representação estudantil, em torno dos temas que interessem aos estudantes. O recorte sobre movimento estudantil, nesta página, em particular, se sobressai pela sua relação direta com o surgimento enquanto entidade vinculada e fruto do ME, sendo a página que mais empreende esforços na elucidação do tema, como será possível verificar.
Entre a estabilidade e a movência: os sentidos de Movimento estudantil
É importante destacar que as considerações que desenvolvemos não se tratam de análises do ME, antes, sendo o nosso interesse investido em torno dos sentidos que estas páginas constroem e mobilizam na tentativa de compreensão, delimitação e apresentação do movimento.
No nosso caso, tomamos estes recortes enquanto representações e reflexos do fenômeno e suas formas de apreensão e designação, de compreensões historicamente possíveis e que se presentificam na nossa sociedade hoje.
Nos interessou aqui, no nosso processo analítico a busca por termos chaves, que buscassem apresentar a definição, pautas de atuação, delimitação, público que o constitui, atuações e as suas relações com a história e com o social.
Recorte 1
Figura- Movimento Estudantil: o que é e como se organiza.
Fonte: <https://vaidebolsa.com.br/blog/dicas-e-curiosidades/movimento-estudantil/> Acesso em 10/03/2022.
Neste nosso primeiro recorte, a definição de ME é colocada enquanto um tipo de ativismo, constituído por estudantes. Deste modo, é caracterizado em termos genéricos de ativismo, tendo a sua especificação precisamente colocado sobre o público que constitui esse movimento. Aqui, o ME é diverso em termos de áreas do conhecimento aos quais estes estudantes estariam vinculados, além de estender a compreensão da fase escolar do público que o constitui, do ensino médio ao ensino superior com no nível da pós-graduação.
Dessa maneira, o ME, neste caso, possui expressamente e exclusivamente o interesse pelo social, entretanto não precisamente com este interesse voltado ao âmbito ou ao aspecto educacional, como poderemos observar em outros recortes. Desse modo, também se sobressai o interesse do movimento não enquanto um recorte que milita pelos seus interesses, antes, apesar da sua constituição exclusiva de estudantes, interessados pelo bem social maior e comum a sociedade, e, por tanto, não restrito ao interesse educacional.
No nosso percurso de compreensão, destacamos que ambas as páginas possuem a capacidade de serem editadas a qualquer momento, o que promove uma instabilidade e possibilidade de escape e mudança. Aqui, ao recortamos, e apresentamos o material ao nosso leitor, estabelecemos uma estaticidade, a fim de apreendê-lo, entretanto já é sabido que até mesmo aqui os sentidos encontram-se em movimento, influenciado pelas inúmeras condições leitura que afetará o leitor ao se debruçar sobre as nossas reflexões e materiais. Também, não acreditamos que exista um discurso puro, ou sentido que não esteja a significar a partir das suas relações com sentidos outros. Sim, estes são heterogêneos e diversos em si, com formações discursivas distintas que operam o seu interior e, de igual modo, relacionados a dizeres outros que operam e funcionam na história (PÊCHEUX, 1990, 1995; ORLANDI, 2008, 2011a, 2011b, 2012, 2019).
Nesta definição, em particular, também se destaca o interesse e articulação a nível mais estrutural, antes podendo operar e funcionar de modo isolado a uma instituição escolar, ou faculdade, a partir da necessidade de cada contexto ao qual este emergirá e se mobilizará. Para nós, essa delimitação possa talvez se mostrar conflitante ao pressupor um engajamento político, econômico e ambiental, tendo em vista que se trata de pautas mais estruturais, não podendo serem combatidas e transformadas de modo isolado e a nível local de uma unidade escolar, ou faculdade/universidade, entretanto, o que nos parece é que aqui o ME é definido de maneira mais global, e, posteriormente, demonstrado a possibilidade de atuação a partir de um recorte sem descaracterizá-lo ou excluí-lo da historicidade do ME nacional.
Posto isto, temo, aqui, o desenho de um movimento estudantil nada singular em termos de ativismo, ganhando particularidade mais especificamente no público que o constitui (diverso, entretanto restringido a estudantes), e o seu interesse claro e explícito pelas dimensões sociais, políticas, ambientais, econômicas e coletivas, para além do âmbito educacional, antes, o tomando, como precursor e agenciador destas outras discussões na consolidação e formação estudantil e da sua consciência política.
Recorte 2
Figura- Movimento Estudantil, UNE.
Fonte:<https://www.une.org.br/memoria/historia/> Acesso em 10/03/2022.
Este nosso quarto recorte, no tocante a definição e delimitação do ME, é o mais distinto dos demais na sua dinâmica de apresentação. Dessa maneira, antes de apresentar enquanto, ela busca sustentar a compreensão da definição da historicidade que constitui o movimento enquanto um movimento social, e político de luta estudantil e de intervenção no social.
Desse modo, busca as raízes e a historicidade do movimento no início do século XX, fruto das organizações estudantis que emergiram ao longo da história. Nos apresentando um movimento desde sua gênese articulado e interligado, por meio da promoção de congressos, ações, etc. Tendo seu público majoritariamente constituído pela população jovem.
Nesse caso, o interesse do ME é estruturado a partir de pautas bem definidas com mobilização e articulação a nível nacional. Na qual, o ME explicitamente possui vinculação, comprometimentos e articulações políticas, partidárias, etc., a depender das condições e conjunturas sob as quais ele é convocado e precisa se mobilizar. Ação e pauta, neste caso, emergem das conjunturas políticas enfrentadas, por mobilizações estruturais e nacionais.
De igual modo, existe uma aproximação direta com movimento partidário e políticos que se interessem, defendem e militam pelas questões sociais e classes menos favorecidas, não sendo compreendida pelo interior do movimento essas articulações e vinculação políticas enquanto um demérito, antes enquanto uma importante marca social distintiva que os caracteriza enquanto explicitamente defensora das pautas e dos interesses sociais e coletivos. Nesse caso, o ME possui articulação, força e mobilização de atuação pelo fator coletivo.
O ME, nesse contexto, apesar de expressões nacionais, e o interesse partidário pelo social, não se resume também a uma unidade e síntese em termos ideológicos do movimento, sendo este também diverso na sua constituição, sem perder o interesse maior e privilegiado pelas esfera e questões do social. Este, apresenta na sua constituição ao longo dessa história, acusações e ligações políticas e ideológicas. Mesmo diante do anseio de uma unidade representativa e organizativa única que fale por todos os estudantes e que possuía reconhecimento nacional por parte de todos os estudantes.
Aqui, o ME possui e se estrutura a partir de um tripé em termos educacionais que lhes são centrais, a saber: a qualidade de ensino, este em todos os seus níveis, a defesa do patrimônio nacional (aquilo que é importante para o crescimento do país e bem-estar social da população), independente da conjuntura partidária que esteja no poder, e a primazia e defesa pela justiça social.
Dessa maneira, ao possuir esse tripé de eixo central se articula e se mobiliza na promoção e defesa destes, no intuito de fornecer um bem-estar social maior e defender os interesses de todos os estudantes enquanto classe, a partir da centralidade do pilar educação na história social e nacional do país em seu desenvolvimento.
Nesse contexto, podemos observar um movimento que se delimita e se constitui a partir das suas relações com a história, com o surgimento de entidades e articulações estudantis, de mobilização e força de atuação nacional, na defesa dos direitos e interesses dos estudantes e da democracia nacional.
Considerações finais (?!)
Feito estas considerações, é importante destacar que os sentidos em torno da definição ME, como vimos, tem se apresentado múltiplo e diverso na sua constituição. Se caracterizando pelas suas correlações com a história enquanto movimento social. Nesse contexto, buscamos perpassar brevemente sobre dois recortes no intuito de compreendermos os sentidos de movimento estudantil que ali se presentifica, de modo a circular, operar e funcionar socialmente em torno do ME brasileiro, com o objetivo de informar ao leitor leigo ou especializado em que consiste o movimento.
Como pudemos observar, sob o suporte teórico-metodológico e percurso analítico, no nosso primeiro recorte, embora o ME possua na sua essência o ativismo político, este não se apresenta restrito às questões educacionais, explicitamente presente no segundo recorte analisado, mesmo tendo seu caráter plural, produzindo uma plasticidade ao movimento, a partir de distintas condições históricas e as demandas políticas e sociais que o tempo presente coloca sobre o movimento. No segundo recorte, temos a ênfase em aspectos de atuação, mobilizações e articulações a nível nacional, já no primeiro caso, a possibilidade de ação dispersa e isolada. Apesar de controversas em pontos particulares, tratam-se de leituras possíveis em torno do movimento.
Perscrutar entre a estabilidade e a movência dos sentidos em torno do ME brasileiro, nos permitiu perceber os aspectos atrelados a constituição do movimento, a pauta de bem-estar social, e a heterogeneidade constitutiva do movimento, não podendo ser reduzido e/ou generalizado, antes, plural, diverso, contraditória, e politicamente situado diante das conjunturas políticas experienciadas.
Quando investigado, esses sentidos hoje, nos permitem apreender com estes movimentos tem se inscrito de distintos modos na história, e tem sido percebido e significado de modo contrastivo por distintos sujeitos/plataformas, conjunturas, e agentes na compreensão e leitura da luta e da mobilização em torno do ME na história.
Antes de esgotar os sentidos e as possibilidades de incursões analíticas, buscamos desnudar um movimento que nos permitiu observar distintos modos de perceber e designar o Movimento Estudantil na história, seja pela sua articulação política e social inerente ao movimento, ou a tentativa de designá-lo de forma apartidária e apolítica, desvelando um terreno que ainda se apresenta de modo contraditório, entre a estabilidade (aspectos constitutivos na definição do ME) e a movência (a especificidade que este se apresenta, e se distancia em termos históricos, espaciais, políticos, etc., do movimento social estudantil maior), nesse constante deslize que se inscreve na história e nas suas relações com a atuação/mobilização e a memória social do movimento.
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